Não escolhemos a paixão pelos vinhos — são os vinhos que nos escolhem, arrebatam, sacodem e arrastam como uma torrente até tornarem as nossas vidas plenas, irreconhecíveis. Foi assim com José da Mota Capitão, o engenheiro agrónomo que ergueu nas margens tranquilas do Sado os vinhedos da Herdade de Portocarro e aí recriou, para encanto dos enófilos, vinhos graciosos, de uma acidez delicada, com uma frescura vibrante, que parecem ter chegado de muito longe trazendo apenas as coisas boas do mundo.
A propriedade tem servido a imaginação inesgotável do seu patrono, acolhendo castas remotas, como a italiana Sangiovese, ou esquecidas na região, como a Galego Dourado, um símbolo de Carcavelos. A sua localização privilegiada — nas margens do rio, recebendo ainda a frescura da maresia, mas uma maresia temperada pelo influxos quentes do Alentejo — convida ao exotismo. E a vastidão dos arrozais, a perder de vista, em que a vinha nunca foi tradicional, encerra um forte apelo à criatividade.
Um apelo a que se respondeu com energia. Em pouco mais de uma década nasceram o Herdade de Portocarro, um lote de Aragonez, Alfrocheiro e Cabernet Sauvignon; o Cavalo Maluco, homenagem bem-humorada ao mais famoso chefe Sioux Crazy Horse, com Touriga Franca, Touriga Nacional e Petit Verdot; e também o Anima, feito a partir da casta italiana Sangiovese, tinto fresco, elegante, muito gastronómico inspirado nos lendários Brunello di Montalcino.
Depois viria o Alfaiate, lote de Sercial, Galego Dourado, Arinto e Antão Vaz, um branco austero, fresco, seco, intemporal. E também o Autocarro Nº 27, a que o crítico de vinhos João Paulo Martins chama “um Herdade do Portocarro sem estágio em barrica”, ficando apenas em balseiro após a fermentação.
A chama, a graça e a vivacidade deste portfólio contribuíram muito para o prestígio considerável do produtor, que acolhe o caloroso entusiasmo da crítica sem nunca perder o respeito pelo terroir, numa Herdade tão fértil como a imaginação de quem o cultiva.