Não é fácil considerarmos o que teria perpassado pelo espírito de João Maria Alves, a quem chamavam João Clara, quando em 1975 se envolveu, não em uma, mas em duas missões temerárias. A primeira foi a de adquirir uma propriedade de 28 hectares no ano mais tórrido da revolução portuguesa. A segunda foi a de aí cultivar uvas para que delas se tirassem vinhos de elevada qualidade, desafiando os costumes locais.
Quarenta anos depois não restam dúvidas de que a coragem do fundador deu bons frutos. A Quinta, administrada pelos descendentes de João Clara, afirma-se entre os mais respeitados produtores do Algarve.
Localizada em Alcantarilha, concelho de Silves, possui um terroir de solo argiloso e clima temperado, mediterrânico. Ali foram introduzidas em primeiro lugar duas castas típicas do consumo regional: a Negra Mole, nascida de um cruzamento entre Pinot Noir com Grenache, e a Crato Branco, a que se chama Síria ou Roupeiro noutras latitudes. Para recriar um perfil de vinhos contemporâneo plantaram-se depois parcelas de Trincadeira, Aragonês, Syrah, Alicante Bouschet e, por enxertia, a soberba Touriga Nacional.
As castas brancas mereceram atenção mais extemporânea. Em 2010 surgiriam troços de Arinto, Verdelho, Alvarinho e Moscatel.
Deste punhado de castas retira-se o selecto portfólio actual, segmentado em duas marcas: a João Clara, propriamente dita, reúne os vinhos premium da casa, enquanto o rótulo Às Claras identifica um branco e um tinto de preço médio, para o consumidor informal. Todos resultam de colheita à mão e vinificação com controlo de temperaturas em cubas de inox, na adega própria, num trabalho enológico de Joana e António Maçanita.
Os vinhos João Clara perfilam-se em Tinto, Branco e Rosé, a que se somam um Reserva Homenagem 2009, um Reserva 2010, e ainda o monovarietal João Clara Negra Mole 2011. São vinhos elegantes, muito aromáticos, que ano após ano têm merecido ampla consagração em festivais.
Em 2015, para não sermos exaustivos, a Confraria dos Gastrónomos do Algarve declarou o Tinto João Clara “vinho do Algarve 2015”. O Branco 2014 recebeu medalha de Prata no Wine & Spirits Awards 2015. E o Rosé alcançou o Ouro no mesmo evento, bem como o João Clara Homenagem 2009. Também em anos anteriores se avolumaram distinções na Decanter World Awards, no Internacional Wine Challenge ou no Concours Mondial Bruxelles, entre outras.
Na Quinta João Clara, o ciclo virtuoso dos vinhos algarvios é observado com serenidade. Afinal, há já quatro décadas que o João Maria Alves, nos tempos quentes de 1975, tinha antecipado esta revolução.